Compósito feito de retalhos e resina epóxi flexível |
Um
estudo na área de têxtil e moda verificou que a mistura de fibras descartadas e
destinadas a virarem lixo a placas de resina aumenta a tenacidade e resistência
desse material. A tese de mestrado de Welton Zonatti se dedica à reciclagem
têxtil, aliada ao design, buscando uma forma de reaproveitar o grande volume de
resíduos dispensados na produção de artigos de vestuário.
Do luxo ao lixo têxtil: problemática urbana
Os
bairros do Bom Retiro e do Brás, em São Paulo, se destacam pela profusão de
confecções e chegam a produzir juntos 26 toneladas de resíduo têxtil por dia. O
descarte atualmente é regido pela política nacional de resíduos sólidos, de
2010, que realiza a gestão compartilhada de resíduos. Porém, “gestão
compartilhada”, no caso, quer dizer que estes são recolhidos
indiferenciadamente, não havendo política própria para o que resta dos tecidos.
Há uma quantidade máxima permitida confecções podem depositar na calçada e,
respeitando este limite, o poder público é obrigado a recolher o volume e se encarregar
de seu destino – que, exceto por cerca de 1 tonelada (das 26 diárias)
encaminhada para as recicladoras, é levado aos aterros sanitários junto com
outros tipos de lixo. Agravando estre problema, muitos dos tecidos utilizados
hoje no Brasil são importados de países asiáticos como China e Bangladesh, cuja
política ambiental “permissiva” faz com que o produto possa conter quantidades
altas de corantes tóxicos, passíveis de contaminar o solo quando depositado no
aterro.
Tendo
em vista o volume significativo de despejos, as alternativas para um melhor
gerenciamento desse material seriam investir em empresas de reciclagem, com
maquinário expressivo para a produção de um novo fio a partir de um velho, que
será reinserido na cadeia produtiva, orquestrar a logística de distribuição do
lixo para as empresas e, também, fundamentalmente, a separação prévia do
material pelos confeccionistas. Esta coleta é muito importante, uma vez que ao
misturar os retalhos a outros tipos de resíduos orgânicos, as confecções responsáveis
inviabilizam a reciclagem: é necessário que se saiba a composição exata das
fibras, o ponto de fusão de cada uma ali presente, já que se misturadas e
submetidas a processos com altas temperaturas, podem se fundir ou pegar fogo.
O
experimento
Na etapa
experimental do estudo, o pesquisador se ateve à fibra de algodão, a mais
consumida no Brasil – 70% dos artigos de vestuário produzidos são feitos desse
material, sem contar que o país é o segundo maior produtor de denim (utilizado
na confecção do jeans), feito exclusivamente dessa fibra – mas realizou também
alguns testes com fibras de poliéster. Após verificar por meio de microscopia
se as indicações do tecido correspondiam à sua composição real, isto é, se o
que por exemplo é definido como “100% algodão” de fato contém 100%
de algodão, resíduos de calça jeans e de chifon (trama feita de
poliéster). Três diferentes resinas, epóxi, poliéster ortoftálico e
poliuretano, foram misturadas a estas fibras, destino que diminuiria a
quantidade de refugos têxteis nos aterros. As propriedades das placas de
resina puras foram comparadas às das placas reforçadas com fibras.
O
compósito – feito de pelo menos dois componentes, cujas características são uma
combinação entre as da matriz e das fibras, além da interação entre ambas –
resultante se tornou viável tanto do ponto de vista da qualidade do material,
que ganhou resistência e coesão, quanto do ponto de vista do apelo visual, que
o torna aplicável na área de moda. Empregando o conceito do eco-design,
agregador do reuso consciente à criação de um produto esteticamente funcional,
Zonatti produziu ainda peças de bijuteria para validar o estudo. Mas destacou
que as possibilidades de aplicação do produto não se restringem ao artesanato.
Gema de colar produzida com resina epóxi e resíduos têxteis |
Bracelete produzido com resina epóxi e fibras têxteis oriundas dos resíduos de calça jeans e camiseta |
A
bibliografia disponível sobre materiais compósitos, praticamente segmentada na
área de engenharia, foca numa análise meramente química e mecânica. Por isso
também a pesquisa inova, não somente por comprovar o que se propõe, mas pela
busca de reunir moda (estética) e têxtil (função), com cunho sustentável.